quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Sobre agonizantes e mortos (Cledson Sady)


Na bela cidade de ouro, cercada de serras majestosas
Como cantou a poetisa, como bradam os devotos
Hoje tem dois tipos de gente:
Os agonizantes, que estrebucham, mas falam,
E os mortos, que vêem, sentem, mas calam.

Os mortos, dizem, são muito vivos, não querem largar os ossos.
Mesmo expondo mau cheiro pútrido, hálito de morto
Dizem-se limpinhos e puros, direitos como paus tortos.

Os agonizantes, coitados, gritam é de dor.
De verem os seus a minguar, sem ajuda de doutor
Sem terem a quem apelar.
Quando querem soltar o último grito são impedidos,
Como seu Zé alfaiate, que quase perde o braço
Pois se meteu a agonizar na frente de uns mortos fedidos.

Quem mais reclama, agoniza, é mesmo o seu Alvarenga.
Escrevente de primeira, no estilo de Gregório, o Boca do Inferno,
Não deixa passar uma bobagem que tira os mortos do céu
Fazendo-os sentir as labaredas, a chegar o fogo eterno.

Ainda tem o João da rádio, agonizando por uma besteira.
Segundo os mortos, ninguém morre por causa de pouca poeira.
Mas poeira em quem agoniza e não reclama
Faz o cidadão virar morto de carteira.

A cidade é muito bela, quem chega aqui é acolhido.
Se for vivo vira morto,
Se não for, vai agonizar.
Cidade de gente boa e religiosa
Ajoelhou, não reclamou, é morto e tem que rezar.

Jacobina, 04 de Agosto de 2011

Cledson Sady
Membro da Academia Jacobinense de Letras

Nenhum comentário:

Postar um comentário